SIMÃO (1) cavalgava apressado, envolvido na capa negra. A noite acolhia-o. Mal chegara e logo ela encontrara o moço Simão Pires — um cristão novo — cavalgando direito ao convento de Santa Clara. Era assim quase todos os dias. Nem esperava pelo seu fim. Ousado e valente, Simão não cuidava, sequer, de tapar o rosto. Mas o crepúsculo avisava a noite, e esta vinha logo encobri-lo. De quantos amores às escondidas a noite é cúmplice! Também era ainda a noite que ajudava Violante — uma linda noviça — a sair ao jardim para falar a sós com o seu bem-amado. Porque ela não pensava ser freira. Ela amava Simão. Amava-o profundamente. Porém, seu pai, fidalgo arrogante, afas¬tara-a do caminho do seu amor, encerrando-a num convento.
O cavalo parou a um simples esticão de rédeas. Ali estava o muro. Breve cairia a escada de corda. O coração pulou-lhe. A escada tocou no muro. Simão deixou o cavalo, que sabia esperar pacientemente, e subiu. As suas mãos, no cimo, tocaram outras mãos. O seu rosto, outro rosto. Saltou para a cerca. Estavam, finalmente, juntos.
— Querida Violante! Esta espera mata-me! Sem ti não saberei viver! Ela ciciou quase, anichada nos braços fortes do seu bem-amado:
— Meu amor, acalma-te! Eu penso como tu mas... teremos de saber esperar um pouco mais...
Ele disse com arrebatamento:
— Não posso! Vou amanhã mesmo falar com o teu pai! A noviça apertou-lhe as mãos.
— Não... não faças isso por agora! E numa voz quase chorosa:
— Hoje o meu pai esteve aqui... falei com ele... mas encontrei-o inflexível. Quer que eu professe!
A jovem sentiu-se mais presa do abraço forte de Simão. A voz do bem-amado soou rouca aos seus ouvidos:
(1) — SIMÃO — Trata-se do jovem hebreu Simão Pires Solis, acusado de roubo sacrílego, e que foi queimado vivo em 3 de Novembro de 1631. A sua inocência foi depois provada.
Amanhã continua …
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